domingo, 3 de março de 2013

Eu, Joaquina e o Pequi

Por Leda Chaves
Estrada de terra

Estávamos todos na fazenda. Era carnaval, mas ninguém ali estava a fim de folia. Queríamos mesmo era a paz do mato. O canto vinha dos pássaros, dos grilos, das cigarras. Eram tantos pássaros que a gente não sabia para onde olhar. Araras, maritacas, pássaros-pretos, saís, periquitos, joões-de-barro, sanhaços, andorinhas e um tão pequenininho que parecia de brinquedo. Até um urubu eu vi lá. Todos lindos, livres. Tantos voos diferentes!

Pássaro preto pousado em tronco

O mato estava exuberante como eu não via há mais de um ano. É... havia quase um ano que eu não ia lá. Estava tudo tão verdinho! As árvores brilhavam ao sol. O céu esteve claro e azul o feriado todo. À noite, a gente podia ver as estrelas no céu. Ah! Como são lindas as estrelas! E a lua nova?! Na segunda-feira a lua começou a se por lá pelas 17:30. Foi um espetáculo. Eu e a minha irmã ficamos lá fotografando. Eu estou estudando a minha máquina e consegui alguma coisa, mas a minha irmã tirou fotos espetaculares! A lua estava indescritivelmente linda, sem contar os vagalumes piscando sem parar no gramado.

A natureza está sempre nos surpreendendo. Quando paramos para observar, é um espetáculo atrás do outro. Tantos detalhes tão miúdos e sutis! Até uma lagarta de pelos brancos eu vi lá. Teve também correção de formigas invadindo a casa, subindo por dentro da calça de quem se descuidava. Eu mesma tive que sapatear umas duas vezes por causa delas. Entraram dentro do tênis, dentro da calça. Ai!!! A picada delas doeu.

Lagarta branca peluda

Correção de formigas

Eu tinha à minha janela uma orquestra todo dia, na alvorada. No último dia que fiquei lá, um pássaro preto veio cantar bem pertinho, pousado num galho seco da árvore. Estava lindo, com a luz do amanhecer batendo no peito dele. Parecia que estava ali desfrutando do calor do sol. Cada dia era um pássaro diferente que vinha pousar ali. Como eu adoro mesmo as manhãs, levantava-me e ficava olhando o céu ir mudando de cor até o dia amanhecer por completo. Eu nunca me canso de olhar tudo isso. Só pode mesmo ser fruto de muito amor.

Pássaro preto pousado em galho ao amanhecer

Alvorecer em fazenda

As flores: eram muitos tipos e tamanhos diferentes. Ah, como eu adoro tirar fotos dos bichos e das flores! Desfrutei muito de todas elas. Nesses nove dias que fiquei lá, tirei mais de setecentas fotos. A gente vai andando no mato e vai vendo as flores. Algum de vocês já viu a flor da grama? Mas é tão miudinha e tão cheia de detalhes que dá gosto de ver. Por isso é que ao amanhecer, as abelhas ficam zoando pra lá e pra cá, voando bem baixinho no gramado. Elas ficam lá até o orvalho secar. Depois elas vão embora e voltam só no dia seguinte. Pois é, foi nesse cenário, que pudemos desfrutar o feriado.

Abelha pousada na flor da grama

Flor silvestre no cerrado

Numa daquelas noites, estávamos todos na cozinha, jantando. O menu era carne cozida com pequi. Ainda tinha pequi lá. Eu adoro pequi. Sentei-me confortavelmente à mesa e comecei a comer pequi com arroz. Ai, que delícia! Era um arroz temperado e o pequi cozido. O pequi deve ser roído com cuidado por causa dos espinhos que ele tem dentro do caroço. E eu estava roendo os pequis com tanta alegria e gosto que Joaquina também quis provar o tal pequi.

Joaquina é uma menina de três anos, cheia de energia, muito observadora e esperta. É morena, olhos bem redondos, cabelos cacheados. Ela estava sentada do outro lado da mesa, no colo da mãe dela e olhava pra mim enquanto eu ia roendo os pequis. E de repente ela disse: “Eu quero pequi, mãe!” Então, eu a chamei e disse: “Vem cá que eu te dou um pouquinho para você provar.” A mãe dela se levantou e eu falei: “Põe ela aqui no meu colo que eu estou treinando para ser avó!” E foi assim.

Pequi em pequizeira

O pequi tem um gosto e um cheiro muito fortes e por isso eu achei mais prudente dar um pequi para ela cheirar. E ela não gostou do cheiro e desceu do meu colo e voltou para a mãe dela. E eu continuei comendo o pequi e Joaquina, do lado de lá, olhando e sentindo uma vontade enorme de comer pequi. Daí a pouco ela voltou. “Prova!”, eu falei. E ela deu uma lambida no pequi e foi embora de novo fazendo careta. E continuou do lado de lá da mesa, olhando e querendo o pequi. Resolveu tentar de novo e, dessa vez, depois das explicações tradicionais sobre os espinhos, deu uma roidinha no pequi. Foi então que desistiu de vez. Era uma pena, mas não conseguia gostar do tal pequi. Sentou-se no colo da mãe de novo, continuou olhando para mim e suspirou conformada.

O feriado acabou e todos voltamos para BH, para as nossas vidas costumeiras. Voltamos para a metrópole barulhenta, cheia de fumaça e correria. Cada um em sua casa, de volta ao trabalho e à luta diária pela sobrevivência. Joaquina tinha também uma rotina para seguir, mas não sofria com isso como os adultos. Ela era bem disposta para tudo.

Trilha em mata

Num dia desses, num final de tarde, alguém levou pequi para a avó dela e perguntou para Joaquina se ela gostava de pequi. Ela respondeu prontamente: “Eu não gosto não, mas eu sei quem gosta de pequi. É a Margarida!”

Um comentário:

  1. Que delícia ler seus textos... nesse em especial, pude me transferir pra essa atmosfera de natureza e a pureza da menina de três anos. Que você continue sempre nos presenteando com suas palavras.

    Abraços,

    Manu

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